Ainda estou meio que com os pés no pedal vivendo todos esses sete dias que foram inesquecíveis viajando de
bicicleta, como acho que tudo nessa vida que é apenas um leve e passageiro
sopro deve ser.
Em amarelo todo trecho percorrido de bike. |
Eu e Kico estávamos planejando uma viagem para o sul do
Brasil em Agosto, mas tivemos que mudar nossos planos por várias coisas que
aconteceram ao longo dos meses, nada deixou de ser especial por isso, o sul
ainda continua nos nossos planos
de cicloturismo.
Então começamos a pesquisar uma viagem pelo Gandarela, eu
pedi algumas dicas ao querido Bernardo da banda Músicas do Espinhaço que é um
conhecedor daqueles caminhos...e que caminhos.
Partimos então eu , Kico nossas magrelas lotadas rumo ao Gandarela, na realidade fizemos um
pequeno trecho da Serra do Gandarela, Caraça e inúmeros trechos da estrada
real.
1º
dia - BH / Sabará/Morro Vermelho – 51Km
-26km Terra
Saímos de BH no dia 30 de Junho, o Kico chegou aqui em
casa com a bike linda, toda montada, os alforjes até piscando de vontade de
pegar logo a estrada.Eu senti toda emoção nos olhos dele é a liberdade das
amarras da sociedade que a bicicleta nos proporciona.
Despedida na porta de casa Raulzito, ainda levo ele comigo |
O trecho até Sabará é bem chatinho, tendo que ter muita
atenção por que passamos pela Cristiano Machado, com as bikes pesadas, tem que
ter cuidado qualquer buraco que se passa rápido demais a magrela puxa pra um
lado, rabeia pro outro e o bagageiro pode quebrar.
Saímos da minha casa as 10h00 da manha do domingo o
coração acelerou, afinal esse foi um roteiro as cegas, saímos sem saber o que
nos aguardava, mas pra quem tem coração de criança, a aventura do por vir é fascinante.
Como minha sogra sempre diz: “Ah essas crianças.”
Quando chegamos na entradinha da estrada que da pra
Sabará, tomamos um belo caldo de cana pra repor as forças, uma coisa que já disse,
viagem de bike tem que comer pelo menos de duas em duas horas pra repor as energias.
O dia estava lindo, o céu azul, a brisa de inverno
ajudava no trajeto, na BR tinha um pequenos restaurante, bem exótico por sinal
onde eu e Kico resolvemos parar pra almoçar, já era quase meio dia e a fome bateu.
Comemos um belo frango com ora pro nobis
e conhecemos dois parceiros da bike que passeavam pelo Domingo e acabaram nos
dando ótimas dicas para nosso louco trajeto.
Dono do Restaurante e Kico |
Galera da bike que nos deu a dica do trajeto valeuuuu |
Seguimos nossa viagem buscando a estrada real e
encontramos o primeiro marco, fizemos um dos trechos conhecido como Sabarabuçu,
a terra vermelha brilhava como diamante nossas ricas terras onde o minério
brota por todos os cantos.
Inúmeras linhas de trem cruzaram nosso caminho nesse
trecho da estrada real o trem lotado de minério indo e vindo.
Marco da Estrada Real, trecho Sabarabuçu |
Algumas subidas marcaram esse trecho, algumas paisagens
lindas no final do dia, finalmente chegamos a Morro Vermelho um lugarejo onde
os costumes do interior ainda prevalecem, assistimos uma pequena procissão
diferenciada, pois além dos cânticos a Maria uma banda começava a tocar
alegremente ao final de cada reza, achei interessante.
Morro Vermelho não tem pousada ou área de camping, mas
tem gente de coração puro como foi o caso do Bartolomeu a quem fomos pedir
informação sobre área de camping e gentilmente ele nos cedeu um cantinho
coberto para armarmos nossa barraca e banho quente...um pouso, um aconchego de
um lar tipicamente mineiro, simples mas muito acolhedor e cheio de história. A
esposa do Bartolomeu chegou meio assustada
quando nos viu em sua casa, mas logo quebrou-se o gelo e ficou tudo
bem.Ela fez um jantar muito gostoso, comida de olhar pro céu e agradecer.
Cantinho gentilmente cedido pelo Bartolomeu pra gente passar a nossa noite |
Quando amanheceu, pegamos estrada novamente e deixamos
aquela linda família pra traz com certeza eles terão uma história interessante
pra contar.
2º
dia – Morro Vermelho – Nos perdemos – Acampamento Selvagem -24 km Terra
As vezes a gente precisa se perder pra acabar se
encontrando e realizando coisas ainda maiores, nos perder marcou o segundo dia
da nossa viagem, o Bartolomeu nos explicou como deveríamos fazer pra chegar até
Socorro, passando pelo vilarejo de André do Mato Dentro.
E dale subida negada e muita disposição, são várias
encruzilhadas que realmente nos confundem bem, chegamos a um local onde havia
muita madeira cortada, deduzimos de cara que haveria alguma carvoaria ali por
perto e fomos seguindo por essa estradinha buscando informação sobre como
chegar a cidadezinha de Socorro.
Carvoaria |
Do alto da estrada avistamos os fornos da carvoaria e
logo mais a frente um pessoal a cavalo, conseguimos nossa informação e seguimos
pela estrada até que chegamos as tais bifurcações que o Bartolomeu tinha nos
dito, o povo no interior da informação numa linguagem muito peculiar tem que ficar atento.
Ai minha gente chegamos na parte da estrada que virou
confusão na cabeça, várias estradinhas, o Kico deixou eu ser o GPS ai ai
ai....kkkkkkkk.....ferrou tudo.
Seguimos pelo caminho que pela “lógica” eu achei estar
correto, mas mesmo a minha lógica estando errada valeu cada segundo desse erro,
descemos muito morro, e o Gandarela no agraciou, cadeias de montanhas
maravilhosas a se perderem de vista, florestas fechadas, mais uma vez a
floresta de samambaias que lembra o Congo nos agraciou, eu lembrei na hora do
apelido carinhoso que dei na época da travessia da Lapinha.... “Congo Mineiro”.
Logo percebemos que havia algo de errado, Kico deixou a
bike no caminho e subiu a pé até a carvoaria pegou a informação de que
estávamos no caminho errado, eu já estava morta, na descida havíamos encontrado
um cantinho na estrada com uma pequena clareira que ficava nas margens do rio,
então resolvemos voltar pra la e acampar nesse local.
Tínhamos que pegar o restinho de sol pra tomar coragem de
tomar banho no rio gelaaaaado mas maravilhoso que seria nesse segundo dia nossa
casa.
Acampamento Selvagem |
Tomamos banho no rio ajeitamos as coisas, e montamos
nosso acampamento ali em meio a natureza, cercado de belas árvores e nossa “hidromassagem”
natural de águas cristalinas, não tem como negar o Gandarela é uma imensa “caixa
d’agua”.
Preparamos nosso jantar, somente o barulho da floresta ao
nosso redor e um céu digno do nosso silêncio nos acompanhava, fizemos alguns
alongamentos pra colocar coluna, músculos e o que mais desse no lugar.
Devidamente alimentados fomos nos deitar, sacos de dormir
a postos me encostei no peito do meu lindo e dormi ali vendo as estrelas,
quentinha sob o abraço do meu amor e sob a proteção das forças da natureza.
3º
Dia – Acampamento Selvagem/Caraça – 50km -30km de Terra
Quando amanheceu começamos a levantar acampamento e já sabíamos
o que nos aguardava muita subida apesar de termos feito apenas 24km no segundo
dia foram 24km de muito morro e de descida então com o erro
adivinhem????Subida, muita, muita subida várias vezes eu tive que empurra a
bike, fiquei nervosa(risos) essa parte foi engraçada por que eu queria jogar
todas as minhas roupas do alforje fora pra ver se minha “ancora” ficava mais
leve.Meninas pelo amorrrr de DEUS pra viajar de bike levem somente 5 peças de
roupa e ainda é muito acreditem.
A subida foi sofrida, pensamos que havíamos passado muito
da entrada, bateu um certo desânimo nessa hora e o Kico assumiu a liderança de
ser o GSP ...kkkkk.....decisão mais acertada, mas valeu pela confiança de me
deixa tentar, de me deixar sentir!! (risos)
Pra nossa grande surpresa e alegria a entrada certa
estava mais perto do que havíamos imaginado....uhullll ai foi festa, seguimos
alegres novamente a paisagem cada vez mais linda e se modificando a cada
pedalada.
Cidade de Socorro |
André do Mato Dentro, pequeno lugarejo que foi nossa
parada rápida pra informação se estávamos próximos ou não de Socorro, Kico
pegou cana pra gente na casa de um senhor que nos deu informação e fomos nós
descendo pelos mares de morros.
Finalmente Socorro que lugar mais lindo, cidadezinha
bucólica, espremida entre as montanhas com as bandeirinhas típicas da festa Junina
penduradas pelas ruas, vestígio de alguma festa da noite anterior.
Resolvemos almoçar e que almoço bom, tomamos uma cerveja
pra comemorar ajeitamos nossas coisas e nos despedimos de Socorro que com
certeza precisa ser passagem dos cicloturistas que se aventurarem por esses
caminhos.Um pequeno oratório de nossa senhora na saída da cidade nos abençoou mais
estrada pela frente.
Nossa próxima parada a Serra do Caraça, passamos por
vários locais lindos, várias placas pelo caminho da poderosa Vale do Rio Doce,
uma delas me fez arrepiar o corpo inteiro: PROJETO APOLO, guardem bem esse
nome, por que essa mina fará uma destruição de 8km de extensão pelo Gandarela
infelizmente....
Mai um lugarejo pelo nosso caminho rumo ao caraça Vila
Congo, passamos rapidamente, mas nada passou despercebido pelo olhares
desconfiados dos moradores que deviam se perguntar quem são esses doidos nessas
bicicletas estranhas(risos).
É bonito demais quando a gente percebe que essa tradição
mineira ainda não se perdeu, que esse aconchego que o mineiro do interior traz
consigo ainda prevalece, muito me emocionou
os olhares, a simplicidade e a qualidade de vida dessa gente!
Quando chegamos a Barão de Cocais, antigo distrito do
município de Santa Bárbara, que foi elevado à categoria de município em 31
de dezembro de 1943, a matriz de São João Batista nos encheu os olhos, ficamos
bem animados estávamos bem próximos ao Caraça que seria nosso pouco nesse dia.
Seguimos dessa vez pelo
asfalto e até a entrada do caraça a belíssima cadeia de montanhas nos engoliu,
Kico vibrou de emoção e eu claro na mesma sintonia.
Infelizmente esse foi um dia
que não terminou como gostaríamos, não conseguíamos lugar pra ficar, não conseguíamos
informações pertinentes, e nos deparamos com a precariedade do serviço turístico
não so do Caraça, mas de várias cidadezinhas pelas quais passamos.
Começamos a ficar
preocupados, pois já estávamos cansados, esgotados da viagem e não conseguíamos
pouso, foi quando o Kico disse: “Minha linda, eu não sei pra onde vamos.”
Acho que nessas horas a
velinha que a Dona Marina(minha sogra) deixa acesa pro Kico iluminou nosso
caminho e chegamos até uma pousadinha onde conseguimos um desconto na
estadia.Finalmente um lugar pra passar mais essa noite, cama quentinha,chuveiro
com água quentinha e no dia seguinte um belo e farto café da manha.
O Sérgio e sua esposa donos
dessa pousada que ficamos(Pousada Flores de Minas) pessoas incríveis que no
atenderam muito bem, com muita atenção e também deixaram saudade.
4º Dia – Caraça/Catas Altas – 25Km – 20Km de
Terra
Ainda na pousada tomamos
nosso café da manha e enquanto o Kico usava a internet pra resolver algumas
coisas do trabalho dele, eu lavava as bicicletas pra tirar toda terra,
atividade essa que era diária, viajar por terra requer limpeza das magrelas pra
que nada saia errado.
Bikes devidamente limpas e
lubrificadas, nos despedimos do Sérgio e sua esposa e partimos, mas como já tínhamos
sáido um pouco tarde resolvemos almoçar em Brumal que é a cidade onde fica essa
pousada na entradinha do Caraça mesmo.
Acabou que encontramos um
senhor que tinha uma pousada e um lugar que teria servido de pouso pra gente
acampar no Caraça, mas tudo bem fica pra próxima. Almoçamos conversamos com o Dono
dessa pousadinha, um senhor simples, que demos algumas ideias de como estar
montando uma área de camping no terreno que ele tinha, uma pequena consultoria gratuita.(risos)
Ele adorou a ideia foi nessa
hora que percebi como as pessoas não tem apoio de nada, nem da prefeitura, nem
dos órgãos ligados ao turismo, senti vergonha alheia pela nossa secretaria de
turismo que acha que preparar um lugar pra receber turista é so colocar
plaquinhas dizendo bem vindo e volte sempre, por que as outras informações que
são de praxe não existem. REVOLTADA!!!Praticamente expulsos do Caraça por falta
de informação!
Mas valeu a experiência e
valeu ainda mais as belíssimas paisagens...Infelizmente não conseguimos
conhecer o Santuário do Caraça.
Fomos então em direção a
Catas Altas, estávamos ansiosos não há palavras que possa descrever com tamanha
riqueza de detalhes as paisagens que fomos vendo ao longo do caminho ate Catas
Altas, seguindo os marcos da estrada real, cada qual nos presenteava com belas
histórias, que nos fazia viajar no tempo e espaço.
Faltando mais ou menos uns 12km para chegar em catas
altas, nos deparamos com uma linda ruina de um grande aqueduto de pedra (Bicame
de Pedra), construído com objetivo de abastecer a cidade ou a mineração. São
mais ou menos uns 100 metros de monumento que tem no centro um portal com uma
inscrição datada de 1792, ao lado desse portal uma escadaria de pedra que da
acesso a parte superior onde eu e Kico subimos e ficamos lá admirando ao fundo
a serra do Caraça.
Finalmente Catas Altas que
lugar bonito, o caraça ao fundo da todo um charme ao lugar, na praça principal
onde se encontra a Matriz Nossa Senhora da Conceição de 1739 encostamos nossas
bikes e comemos o pastel da Lu, aliás devoramos 3 pasteis e um caldo de cana
que hummmm deu ate saudade.
Encontramos uma pensão para
passarmos a noite, nessa pensão tinha um quintal bem grande que dava pra gente
acampar, a noite saímos pra jantar e conhecer algumas coisas, resolvemos que o
dia seguinte até mesmo por várias indicações, nós ficaríamos por la pra
conhecer mais a bela Catas Altas.
A noite ventou muito e fez
frio nos braços do meu amor eu adormeci tranquila, quentinha e feliz.
5º Dia – Dia em Catas Altas – Dia dos Extremos
O dia em Catas Altas amanheceu propício a um passeio a
procura das belas cachoeiras da região, do tal vinho de jabuticaba iguaria
famosa ,principalmente depois do festival do vinho que acontece todos os anos.
Pegamos nossas magrelas agora sem o habitual peso do dia
a dia e saímos passamos pela praça
central onde fica a matriz, vimos algumas capelinhas lindas construídas no inicio
do século uma graça.
Tomamos nosso café e partimos dei a sugestão ao Kico de
irmos ate Morro da Agua Quente pequeno
vilarejo distante 5Km de Catas Altas e a medida que fomos andando vimos
a ação da Vale do Rio Doce na região.
Chamei esse de dia, de DIA DOS EXTREMOS, uma paisagem
linda vista da cidade e a medida que fomos andando pela estrada de terra um
cenário desolador, destruição completa das montanhas do caraça, da flora,
consequentemente da fauna.Catas Altas naquele momento perdeu todo encanto e foi
como se uma nuvem de tristeza caísse sobre nós.
Cachoeira destruída pela Vale ao fundo o portão |
Montanhas do Caraça destruídas pela Vale.....Desolação |
O Kico olhava tudo acho que talvez com o mesmo pesar com
que eu olhava, era como se a montanha, se todo aquele resto de lugar pedisse
socorro...sim a natureza grita com uma força inexplicável em nosso coração.
Caminhões e caminhões de minério desciam e subiam, um
cano improvisado vindo de alguma das nascentes, terminava na estrada de terra
cujo um caminhão ia jogando essa mesma água a medida que a poeira ia subindo.
Simplesmente vergonhoso, um cenário de tristeza e agonia
que gritou tanto no meu coração que eu chorei, chorei muito mesmo enquanto
pedalava e olhava tudo aquilo.
Durante esse pequeno trajeto até Morro da Água Quente,
várias manifestações em placas demonstravam a raiva e indignação das pessoas,
as placas diziam: MAIS TURISMO, MENOS VALE.
Em Morro da Agua Quente o cenário também não foi bonito
de se ver , parte da Serra do Caraça que cerca o vilarejo completamente destruída,
dois meninos vinham da aula e paramos pra conversar com eles pra perguntar onde
se tinha uma cachoeira pra podermos ir.
E os meninos com aquele jeito de criança do interior
foram nos falando de algumas cachoeiras, nada nos apeteceu, e a medida que os
meninos iam dizendo tudo que a MALDITA Vale do Rio Doce vem fazendo com a
região, inúmeras explosões que detonaram
varias cachoeiras da, inclusive as termas que haviam que resultaram no nome do
vilarejo.
Tudo destruído, inclusive a dignidade daquela gente expulsa
pelo capitalismo selvagem e avassalador da poderosa Vale, que
inescrupulosamente invade as terras dos moradores e derrubam suas cercas. Onde
esta a justiça? Esquecida nas negociações que Dona Dilma fez a portas fechadas
com os poderosos da mineração do Brasil?
Resolvemos voltar para Catas Altas, durante a volta o
Kico tentou escrever algo numa das placas, a pedra não ajudou muito mas a
mensagem ficou la: FODA-SE A VALE!
Resolvemos subir mais, entramos numa área sem explicação
da Vale, um pequeno filete d’agua que provavelmente já foi uma monumental
cachoeira e um portão dizendo: “Entrada permitida somente para funcionários.”
Que legal o caraça não é mais Patrimônio Cultural é uma
propriedade particular, no alto da montanha ate onde deu pra ir com as magrelas,
resolvemos fazer um pequeno treking, descemos uma trilhazinha e começamos a
seguir o riozinho que cortava as pedras.
Chegamos a um lugar onde se pequenas cachoeiras ficamos
la por um tempo e limpamos nosso corpo, corpo e alma da tristeza e da sensação
de impotência que havia nos dominado.As águas eram cristalinas uma beleza um
aconchego.
Fomos subindo até onde deu pra subir, passamos por dentro
de pequenas cavernas, saímos em lugares mais lindos ainda, locais que ainda
sobrevivem a destruição...não sei por quanto tempo mais.
Já era hora de voltar pra Catas Altas, tomamos um banho o
Kico fez um frango na cerveja improvisado que ficou divino.Conversamos e rimos muito antes de dormir, tanta coisa boa, nos perdemos nas lembranças da infância.
Enquanto meu amor dormia, eu ouvia o
barulho do vento, olhei pro céu e a noite mais uma vez me presenteou com um
lindo manto de estrelas, adormeci ouvindo o barulho do trem que ia e vinha a
noite inteira, matando mais e mais o Caraça e tudo que há...Nosso
quintal estava lindo mas ao mesmo tempo
essa noite ele chorou.
6º
Dia – Catas Altas/Mariana – 57km- 47km de Terra
Levantamos nosso acampamento, nos despedimos da Dona Maria
e da bela Vitoria sua netinha de três anos super precoce pra idade.
Pegamos asfalto até Santa Rita Durão pequeno povoado
antes de Mariana e seguimos novamente por estrada de chão que agora seria um
pouco mais puxada até Mariana onde o Leo um amigo de infância do Kico nos daria
pouso.
Mais uma vez a mudança de cenário na natureza nos
surpreendeu, um caminho inteiro de pequenos Boulders , pra quem não sabe o Boulder
é uma modalidade de escalada em rocha que é praticada sem o uso dos habituais
equipamentos da escalada, esses pequenos blocos de pedra tem mais ou menos de 6
metros ou menos, escaladores corrijam-me se eu estiver errada.
O Kico chegou a brincar em um dele enquanto eu fui sua
spot so não tínhamos Crash Pad mas pro Boulder em questão nem precisaríamos.
Descemos
mais um trilha a pê a curiosidade sempre fala mais alto e demos de cara com um
lindo cânion, ficamos la pegando pedras que brilhavam e tinham formas e cores
diferentes.
Precisávamos continuar nosso caminho rumo a Mariana e mais uma surpresa durante o trajeto,uma linda cachoeira de águas cristalinas, nos convidava e claro não poderíamos ser mal educados (risos).
A estrada para Mariana nos chamava era hora de partir, subidas e mais subidas
as montanhas de Mariana e Ouro Preto iam nos dando boas vindas, várias fotos e carinhos
durante o caminho.
Montanhas de Mariana e Ouro Preto |
A noite saímos pra dar uma relaxada, comemos uma pizza divina e tomamos uma cerveja gelada.Noite fria em Mariana no dia seguinte o árduo caminho até Ouro Preto nos esperava.
7º Dia – Mariana/Ouro
Preto/São Bartolomeu – 37Km – 27km de Terra
Olha
nem eu acreditei que nossa viagem já estava no final foram oito dias que
passaram voando, oito dias de muito “causo” pra contar.
Mariana
amanheceu um picolé, meu Deus que frio, o Leo preparava o carro pra se encontrar
com sua namorada, colocou a Serena, sua cadela dentro, a magrela dele no
transbike, tiramos uma foto pra registrar esse encontro e partimos todos, cada
qual pro seu destino.
Leo e Serena |
Na estrada que leva a Ouro Preto o cansaço muscular já dava sinais as subidas ficaram cada vez mais penosas, mas não deixava de ser mais uma superação na trajetória que marcou esses sete dias.
Quando
chegamos a Ouro Preto eu senti um orgulho muito grande de mim mesma tanta gente achando que eu não ia dar
conta e eu simplesmente não quis ter razão de nada, so quis chegar, viver todos
esses momentos e ser muito, muito feliz.
Quando chegamos a praça Tiradentes em Ouro Preto, paramos pra tomar um chocolate quente e aquecer o peito, ligamos pra minha sogra...Quanto incentivo, quanto carinho....Oh Marina obrigado mesmo pelo apoio moral.
Na
praça Tiradentes o Bruno que trabalha com turismo de aventura nos recebeu
calorosamente e nos deu um trajeto muito legal que era o de seguir até São
Bartolomeu, Glaura, Cachoeira do Campo e Itabirito.
Peitos
devidamente aquecidos era hora de subir o morro mais sinistro que vocês possam
imaginar, sinceramente eu achei que não ia aguentar, mas desistir é um palavra
que passa longe, muito longe do meu dicionário. Alguns Quenianos que vinham descendo o morro começaram a fotografar eu e o Kico...kkkkkk.....viramos atração daquele morro que putz, nem eu acredito que subi tudo aquilo.
Quando
cheguei no topo do tal morro que nos daria acesso a trilha real mal podia
acreditar, eu estava morta, esgotada nem sei se tinha panturrilha, deve ter
ficado pra traz subir um morro completamente íngreme empurrando uma bike com
bagagem é pedreira, não é mole não, haja tudo pra aguentar.
Mas
acima da força vem a vontade e o amor ao esporte, essas são palavras chave pra
tudo que se for fazer nessa vida.
O
cenário de encher os olhos, mais caminhos desconhecidos nos esperava até nossa próxima
parada Glaura, mas no trajeto mais uma vez nos perdemos feio, passamos por
lugares lindos de morrer, mas erramos, erramos muito e voltamos o mesmo caminho
mais de uma vez, foi a primeira vez que vi o Kico dizendo um PUTA QUE O PARIU com
vontade.....kkkkkkkkkkkkkkk.
Cobra que encontramos machucada no caminho pra S.Bartolomeu |
Finalmente
acertamos e encontramos os marcos da estrada Real,seguimos até o povoado de São
Bartomeu num cenário completamente surreal, o vilarejo distante 12km de Ouro
Preto datado do século XVII as margens do Rio da Velhas que funcionava como
deposito de Ouro Preto era caracterizado pelo comercio na frente e as residências
nos fundos.Hoje em dia ainda carrega a tradição dos doces e de uma das melhores
goiabadas cascão que já comi.
Eu queria continuar ate Glaura até que o senhor que carregava o nome da cidade o Sr Bartolomeu nos ofereceu pouso, ta certo que ele tava mais pra la do que pra ca (cachaça brava rsrsrsrs) mas acabou que meu cansaço falou mais alto e ficamos na casa do figura Sr Bartolomeu que falou e contou muito causo pra gente.
Caimos
exaustos na nossa cama sob um teto gentilmente cedido por mais um bom
brasileiro, por mais um acolhedor mineiro.
8º Dia –São Bartolomeu/Glaura/Cachoeira
do Campo – 19km -10Km de Terra
O
frio de madrugada foi feroz até pra gente que dormiu debaixo de um teto, pela
manha a neblina cobria toda cidade uma visão linda e também inesquecível. O
Kico fez um cafezinho gostoso pra gente tomamos nosso café e ganhamos uma
goiabada de presente do Bartolomeu olha que graça?
Montamos
nossas magrelas e um caminho de conto de fadas nos aguardou esse dia, cheguei a
comentar com Kico que sentia que esse seria um dia de muitas surpresas e foi
mesmo.
No
caminho pra Glaura nos deparamos com um cenário incrível de frio e neblina
intensa, meus dedos estavam congelando e a medida que vamos pedalando o frio
almenta, mas nada, nada mesmo me desanimava as flores iam nos enchendo o
coração de alegria, os passarinhos voavam livremente , as montanhas nos
abraçavam era como uma bela despedida que a natureza nos proporcionou.
Seguimos
os marcos da estrada real pra chegar até Glaura até que chegamos num marco que
direcionava pra dentro de uma pequena trilha, essa trilha nos levou pra uma
mata fechada, o acesso era difícil pra bike,tivemos que empurrar mas foi a
trilha de bike mais top que já fiz.
Mata completamente fechada, passarinhos cantavam, folhas dançavam com as cócegas que o vento por ventura fazia, foram 2 km de trilha simplesmente maravilhosos, ate chegarmos a um descampado enorme de Single trekking que levava a Glaura.A torre da igreja matriz de Glaura apontava ao fundo no meio das arvores, uma visão única.
Quando chegamos a cidade paramos numa espécie de “lanchonete”
onde um grupo de cavaleiros havia acabado de chegar de uma cavalgada.
Se passarem por Glaura não deixem de comer a coxinha de la, meu DEUSSSS melhor coxinha que já comi na minha vida, tão boa que eu e Kico comemos ao todo seis salgados....(risos)
Tiramos
nossa ultima foto e seguimos agora em direção a Cachoeira do Carmo, Itabirito
ia ficar pra depois não ia dar tempo o Kico tinha que estar em Juiz de Fora na
Segunda cedo pro primeiro dia de trabalho.
No
caminho encontramos o Marcelo um ciclista que vinha calmamente na sua bike e
ficou conversando no meio da estrada por um bom tempo conosco, nos deu um lição
de vida e sua linha de pensamento é sensacional, é como se pra encerrar nossa
viagem a natureza, Deus ou seja lá o que vocês quiserem chamar tivesse nos
deixado um recado.
E
que recado viu?
Na
rodoviária de Cachoeira do Carmo finalmente sentamos, desmontamos nossas bikes
e ficamos esperando o ônibus que nos levaria até BH.Ficamos em silêncio cada um
em seus pensamentos mas com sensação de missão cumprida.
No
coração um aperto o mundo fictício que o homem criou nos chamava, sim fictício,
a realidade é completamente diferente do que imaginamos como eu sempre havia idealizado.
Resumo da ópera
O cicloturismo é um caminho sem
volta, é um caminho de profunda transformação pessoal, que te ensina coisas
inimagináveis, te ensina um profundo respeito por si mesmo, pelo seu parceiro
de viagem que acima de qualquer coisa é seu melhor amigo.
O cicloturismo te ensina que
precisamos do outro, essa é a necessidade básica do homem, assim como os professores que encontramos pelos caminhos que fizemos nos
ensinaram cada qual a sua maneira.
O primeiro Bartolomeu que nos
acolheu, mostrou que devemos acreditar nas pessoas e acolher de coração aberto
sem medo, o Sergio e sua esposa na pousada em Brumal na entrada do Caraça,
colocando o bem estar e a acolhida acima dos lucros, nos oferecendo um desconto
na estadia em sua linda pousada, em Catas Altas a simplicidade da Dona Maria e
da sua família que nos deixaram usar a cozinha pra fazer nosso frango na
cerveja, em São Bartolomeu a solidão e o sofrimento do Sr Bartolomeu nos
mostrou no dia seguinte um ser humano carente e doce que sentiu ate um certo
pesar com nossa despedida.
E finalmente o Marcelo que pra
mim foi o personagem mais marcante dessa viagem, aos 42 anos de idade resolveu
que queria se aposentar e ser feliz, sair das rédeas controladoras da sociedade
capitalista e viver de acordo com o que seu coração pedia, na simplicidade de
um dia após o outro amando sua esposa e pelo visto grande amiga e companheira.
Todos os caminhos estão certos se
assim você acreditar, todos mesmo alguns mais longos e difíceis,outros fáceis,
mas acredite ou não todos eles te levaram onde seu coração quiser te levar.
Ouça seu coração sempre, guarde o
carro na garagem e venha pra esse mundo incrível do cicloturismo, mas
prepare-se é um caminho sem volta e de grandes modificações se assim você
permitir...Mas quer um conselho permita-se!!!
Foram 263km pedalados em oito
dias, desses 263km, 184km foram de terra, subidas que pareciam nunca acabar,
mas que guardavam uma surpresa a cada chegada, essa é magia de viajar de
bicicleta, poder ver a delicadeza das pequeninas flores que crescem nas margens
da estrada, ou alguma borboleta que vem perdida pousar no seu alforje, assim
faceira e leve como deve ser.
Poder ficar olhando seu parceiro
de longe, livre se misturando na paisagem, conseguir ver nos olhos das pessoas
todas as cores que você busca incansavelmente no dia a dia e só vê
sombras.
Bicicleta não serve so pra
comprar, andar de vez em quando e dizer eu sou um ciclista, ela tem um poder
muito maior o de te transformar num ser humano melhor, mais saudável e com
visão muito maior de mundo e de vida.
Até a próxima!!