Semana passada minha vida se resumiu a uma correria total,
eu e uma amiga aqui de BH administramos um grupo de palhaços de hospital que
faz visitas mensais a instituições de caridade, hospitais, asilos e por ai vai.
Organizamos uma visita durante um mês que acabou não
acontecendo infelizmente, mas creio que nada acontece por acaso.
Quando dei a noticia pro Kico (meu namorado) ele pediu pra
ajudar com o SEMOB- JF (Seminário de Mobilidade por Bicicleta de Juiz de Fora)
e sendo assim eu fui.Nada melhor que lutar por causas que acreditamos.
Cheguei em Juiz de Fora na sexta a noite e começamos a
correr atrás dos últimos detalhes, assar pão de queijo (como todo bom mineiro
isso não pode faltar nunca) finalizando os últimos preparativos.
No sábado, 1º dia do Semob, apesar de poucas pessoas, o que
sinceramente pra mim não faz a mínima diferença, por que eu sempre acredito que
as grandes transformações do mundo acontecem de maneira tímida pra tomar
grandes proporções la na frente.
Como expectadora e fotografa do evento, fiquei observando
toda movimentação dos organizadores, incrível como o olhar diz tudo. Tensão,
preocupação, completamente normal, afinal tudo tinha que dar certo,
representantes de grupos voltados a mobilidade urbana estariam presentes,
Secretário de Desenvolvimento Social, Secretário de Transporte, vereador gente
chique tão pensando o que? E como mineiro gosta de receber “visita” muito bem em casa, não poderia ter
sido diferente.
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Flávio Cheker - Secretário de Desenvolvimento Social |
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Rodrigo Tortorello - Secretário de Transporte de JF |
E não foi mesmo, o cheirinho de pão de queijo com café
servido com todo carinho do mundo refletiu toda alegria no olhar dos
convidados, palestrantes e colaboradores, tudo em perfeita sintonia.
Eu poderia entrar em muitos detalhes, mas acho que seria
injusto citar um nome ou outro por que todos foram astros nessa historia, astros
da vida, da luta pela mudança da qualidade de vida, da luta por espaços
compartilhados que nos reaproxime.
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Guilherme Mendes - Diretor Mobilicidade JF |
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Renata Goretti - Arquiteta e Urbanista |
Um menino na platéia acompanhava atentamente a palestra da
Silvia Ballan, eu fiquei de olho nele, afinal criança é sempre uma caixinha de surpresa.
A medida que a Silvia ia falando ele ia cutucando a mãe que meio sem paciência
disse:”Ta bom filho eu sei.” Achei a
atitude do garoto fantástica, mas ao
mesmo tempo, fiquei olhando com pesar pra ela que deu menos de 5 minutos ao
filho.
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Silvia Ballan - Leva a filha pra todos os lugares na sua bicicleta |
O mundo está diminuindo e não há distância geográfica que a
Internet não possa proporcionar uma aproximação das pessoas que dela se
utilizam para manter contatos entre si, mas em contrapartida, essa dependência
tecnológica nos afasta cada vez mais de viver a vida real, a vida, essa ai que
esta passando do seu lado enquanto você lê inclusive essa matéria.
E vendo que a mãe não deu muita bola, aquele brilhinho que eu
vi nos olhos dele enquanto a Silvia falava da relação dela e da filhinha,
murcharam e até a posição do corpo dele mudou, ele começou a desenhar e deixou
pra la.
A bicicleta proporcionou uma vivência mais intima com o
espaço da Silvia em SP, mas também estreitou os laços com a filha que já aderiu
a bicicleta como um mundo mágico que só elas sabem como funciona.
Tentar reeducar as pessoas é perda de tempo, talvez uma
conscientização funcione melhor, mas lutar contra um sistema “carrocrata” é
complicado e requer muita gente unida num so propósito.
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Placa que a filhinha da Silva fez pra ela colocar na bicicleta da Mãe |
A cidade foi feita pra ser vivenciada, seus vários cheiros,
cores, coisas que poucos conseguem perceber, estar e fazer parte da paisagem
são duas coisas bem diferentes.
Os palestrantes falavam sobre o pensamento errôneo da
construção de vias, as cidades não precisam mais de viadutos, grandes
corredores, elas precisam de espaços repensados pra diminuir essa distância
dolorosa que nos torna cada vez mais mecânicos.
Viver a cidade, entrar em contato é uma experiência
maravilhosa e a muito esquecida, um desprendimento doloroso para os viciados
nas “caixinhas” de quatro rodas, afinal como ficar sem o stress proporcionado
pelo carro a doença do século. É claro que não podemos ser radicais porque sim,
um carro numa situação de emergência é muito eficiente, mas na minha opinião só
numa situação de emergência, o resto é criação e um processo de aculturação do
capitalismo.
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Ava Gambel da Ong Não foi Acidente |
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Ze Lobo - Transporte Ativo - RJ |
Esse seminário foi um chamado a vida, um grito de liberdade,
a primeira tentativa da carta de alforria, da sua carta de alforria, a primeira
tentativa de muitas, da lei áurea desse século. Mas dessa vez de chicotes invisíveis,
de prisões sem grade, de um mundo fictício que inventaram e que enfiaram
garganta abaixo das pessoas que passivamente aceitaram.
Um encontro de pessoas, sem títulos, nem rótulos a ninguém,
um encontro que nos abriu a mente pra novos planos, novas sementes que serão
plantadas. Cada uma num lugar diferente, por que conhecimento guardado não tem
serventia, mas quando esse mesmo conhecimento é compartilhado ele se torna
palpável, tem cheiro, tem gosto.
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Kico Zaninetti - Projeto Nova Origem |
Se uma decisão irradia, que façamos do aprendizado desse
primeiro Semob de Juiz de Fora, a luz e o calor que abrirão as primeiras portas
pra um mundo melhor, mais pensado, mais compartilhado, mais “REAL” e menos
virtual.
Uma nova origem,uma nova High Line,uma vida sem acidentes
(aliás Não foi acidente),uma nova esperança.
Que as várias Marinas* pelo nosso Brasil a fora se sintam
menos doentes e mais felizes, que elas possam flutuar em suas bicicletas e que
vejam que a experiência da beleza , não dessa beleza superficial, mas da beleza
existente dentro de cada um de nós que precisa vir antes.
Que mais viagens entre amigos sejam feitas por bicicleta, pra que sigamos no ritmo que a vida realmente quer que sigamos.
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Aline Cavalcante - Jornalista e pedala como meio de transporte |
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Marcelo Miranda - Projeto Nova Origem |
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Rogério Pacheco - Campeão Brasileiro Ultra ciclista |
Deixar Juiz de Fora debaixo de chuva na segunda, me mostrou
que ainda corro, que o relógio ainda me domina.Meu Deus - disse eu a taxista-
esqueci de me despedir do meu namorado, e uma batidinha na janela, era ele, pra
me dar um beijo de despedida, ele também na minha correria se esqueceu.
Mais amor....Menos, muito menos motor!
Porque uma vida vale muito mais que um milhão, uma vida é
aquele lugar entre o sonho e o despertar, aquele lugar que quando acordamos
ainda nos lembramos dos nossos sonhos.É la que mora a vida de verdade.
Que venham outros seminários, outras sementes e mais luz pro
dia nascer feliz!!!
* Marina - Filha da Silvia Ballan que adora andar por SP na garupa da mãe.Voe na sua bicicleta!