Frio na barriga,
medo e muitas incertezas, esses foram os sentimentos no começo do sábado que se
passou. Quando o Kico me disse: “Minha linda nossa inscrição pro Panamericano
de MTB já esta feita, pela primeira vez na vida fiquei com vontade de matar alguém.
Mas resolvi
encarar, mesmo acreditando piamente que não conseguiria nem completar a
prova,mas milagres também acontecem, podem acreditar nisso.
Na sexta feira
depois de uma semana de recuperação pelo “terreno comprado”( gíria que os
ciclistas usam quando alguém toma um tombo de bicicleta) no final de semana que
antecedeu a competição, eu estava bem preocupada, afinal minha perna ainda não
estava 100% recuperada do tombo e eu não
havia andando de bicicleta nenhum dia.
Que
responsabilidade e que confiança depositada em mim, no sábado a tensão era
enorme, colocamos nossas bikes no carro e fomos pra Barbacena, o clima estava
propício pra competição, tempo nublado e fresco. Afinal de contas, nossa prova
seria 12h30 horário cruel pra qualquer ser humano que se preze, mas São Pedro
foi generoso e deixou um clima bem confortável pra todos.
Enquanto a hora
não chegava íamos compartilhando do clima agradável que se espalhava pelo
lugar, vários atletas de vários países, amadores, profissionais uma só tribo.
Eu precisava
daquilo, daquele clima saudável depois de uma semana nada fácil, ali eu comecei
a me reencontrar.
Encontrei a Maria
Elisa uma pessoa e amiga incrível de Juiz de Fora que apesar do cansaço
estampado no rosto, deixava transbordar a alegria pelo dever cumprido (com louvor,
diga-se de passagem) a Med (apelido carinhoso dela) estava radiante, ela
trabalhou na assessoria de imprensa e comunicação e sabe-se Deus por quantos
perrengues não passou pra ver a coisa toda acontecendo.
Maria Elisa - Med |
O importante é
que aconteceu e foi maravilhoso tanto pra ela como pra todos que participaram
do Pan.
Enquanto a hora
fatal não chegava ,eu ia andando pelos bastidores com minha câmera registrando
o making-of e nos meus clics e andanças conheci o Maurício Mazzei, um fotógrafo
sensacional com um currículo invejável e ficamos trocando algumas figurinhas
depois de termos perdido a largada do masculino.(risos)
O Kico foi
entrevistado pela Renata Falzoni um ícone da moçada da bike, ela é fotógrafa,
vídeo repórter, bike repórter e cicloativista. Foi pioneira na valorização do
uso da bicicleta no Brasil, tendo sido uma das fundadoras do Night Biker's Club
do Brasil em 1989.O Kico não perdeu essa oportunidade e falou sobre vários
assuntos, inclusive o lindo trabalho do mobilicidade JF que ele e o Guilherme
vem desenvolvendo de maneira incrível em Juiz de Fora, modificando aos
pouquinhos esse cenário da bike nos grandes centros urbanos.
A grande hora
chegou, eu não conseguia segurar o nervosismo, mas descobri que isso é
absolutamente normal antes de uma prova, foi só olhar para os lados e perceber
que todos estavam como eu.
Quando a largada
foi dada o sentimento era de pura emoção, tudo transbordava dentro de mim, um
salto pro infinito, um vôo sem mapa de navegação.
![]() |
Concentração antes da largada |
Decidi que se não
me concentrasse não seria fácil, então me desliguei de tudo, parei de ouvir os
aplausos, os gritos, mas a última imagem que ficou comigo foi a da Maria Elisa
(Med) gritando quando nos viu no meio da “manada”: “Vai meu amigo Kico
Zaninetti, vai Leticia.”
Depois disso eu
me desliguei totalmente, so ouvia a voz do Kico me dando as coordenadas de
tudo, marchas, força,gira,gira, vai, ta lindo, ta maravilhoso minha linda, de
camisa amarelinha (ele começou a cantar
kkkkk) , vai, so mais um degrau, isso minha linda, depois desse morro estaremos
na metade da prova, força , gira,gira,issoooo minha linda, ta
maravilhoso,água,banana grudada na boca inteira, descidas,
cuidado,dor,dor,muita dor,câimbra, spray na panturrilha,gota de suor escorrendo
no meu queixo, chão batido, pedrinhas soltas,pedronas soltas, pneu , cravo do
pneu, copo de água, vai,vai, to meu limite Kico não consigo mais forçar, esse é
o espírito minha linda.E quando eu vi o olhar do Kico me dizendo mesmo sem
falar uma so palavra:”Consegue sim linda vem.”
Nessa hora que eu dei meu
ultimo gás, nem sei onde encontrei forças mas encontrei, a outra dupla passou
por nós, tentei encostar na menina da dupla, mas ela me ganhou na descida eu
ainda não me sinto segura nas descidas.
Faltavam 5km pro
final eu já não aguentava mais, ultrapassamos um outro competidor que sofria
com as terríveis câimbras, oferecemos um spray pra aliviar mas ele não aceitou,
preferiu continuar, respeitamos e não insistimos.Nessas horas cada um se testa
a sua maneira, talvez aquele fosse o momento dele.
Quando avistei a tenda,
só ouvi o Kico dizer:”Bora linda ta chegando gira, gira.” E foi o que fiz
quando chegamos, só ouvi uma pessoa
dizer:”Dupla mista 11º lugar.
Já fiquei muito feliz quando ouvi
isso, poxa 11º pra quem nunca competiu e ainda me recuperando de uma lesão, já
abri um sorriso daqueles.
Mas o desgaste era terrível, os
músculos se contraindo, a perna queimando de dor, mas uma dor que remetia
prazer, um grande prazer pelo dever cumprido.
Foi então que ficamos sabendo que
quase pegamos pódio, por muito pouco mesmo não ficamos entre os 10 primeiros
colocados, ficamos a 24segundos da dupla 10ª colocada.
Eu vi o que move um atleta, não sei se
conseguiria explicar, mas ali, naquela hora, com todas as partes do meu corpo
gritando eu percebi que o que move o atleta é sim uma paixão que lhe é
intrínseca, que é parte dele, que faz com que tudo se mova de uma maneira muito
sutil, mas que é peculiar a cada um.
Uma conexão com o que há de melhor em
cada um, um encontro marcado com a pessoa mais importante desse mundo...VOCÊ
MESMO!!!
Deixar Barbacena pra trás doeu no
coração, senti que, apesar
do aprendizado maravilhoso sobre a transitoriedade e impermanência da vida, eu
poderia fazer o que eu gostaria de fazer e o melhor, não me sentia apegada a
esse sentimento. É difícil transpor em palavras, não sei explicar, exatamente,
como me senti, acho que me senti livre, me senti como uma tempestade de verão:
forte, intensa, sem limites.
Valeu demais, valeu Kico meu amor, meu
treinador, trocar olhar com você no final da prova me trouxe a certeza de um
amor bonito e acolhedor e valeu a todos os amigos que de forma direta e
indireta me empurraram pro alto.
Pra cima....sempre!!!
Que venham os próximos!
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